Ladra Foguete.docx
Luli dá uma vasculhada na pochete, apalpa os bolsos da calça, do casaco, e alguém pegou meu isqueiro?
Na outra ponta da mesa, Manu acerta a jogada. Desviando dos copos americanos e latinhas, um bic amarelo atravessa Ju e vem parar na minha frente. Eu estico pra Luli.
— Esse não é o meu — ela acende e joga de novo na mesa, o amarelinho fica ali atirado, dando bobeira.
Eu sei que não é o dela. O dela é um bic roxo pequeno. Foi a cor que escolheu pros isqueiros do ano. Tática de marcação de propriedade.
Lá em casa eu tenho uns quatro, só. Ela costuma ser bem atenta, mas agora pouco, não sei se por ressaca ou cansaço ou sono ou um mix de tudo, Luli vacilou — foi ao banheiro e esqueceu o roxinho na mesa. Aí ele veio parar no bolso esquerdo da minha jaqueta jeans e hoje, vai pra casa comigo.
O acende-e-guarda automático, sem dolo, deu espaço pra intenção de roubo quando comecei a armazenar juntos todos os isqueiros que brotavam em mim. Não que eu seja do tipo que gosta de sair queimando tudo, mas virou um ritual (pra variar, um ritual). Assim que entro em casa, me esvazio dos isqueiros surrupiados no rolê e meto numa cestinha. Um sorriso inevitável acende no meu rosto.
Tenho aprimorado nas técnicas, disfarces e distrações. Ontem mesmo consegui um adesivado, duma amiga que marca isqueiros com pequenas estrelas, provavelmente desses cadernos que os anos passaram e as figurinhas ficam.
Os copos esvaziam e enchem duas vezes. O amarelinho ainda tá na mesa. E agora surgiu um bic vermelho grande que Ju larga depois de acender um mentolado de fumaça fresca. Eu pego o bic vermelho e vejo que Luli repara.
Fico brincando de estalo. Com o polegar, giro pra dentro a roda de faísca num creck creck, daí viro o isqueiro e deposito o excesso de ferro no dedão. Depois com o indicador, lanço o pó cinza do dedão contra a chama estourando estrelinhas.
Ninguém mais repara quando num movimento rápido e contínuo levanto buscar cervejas e guardo o isqueiro vermelho no bolso, do lado do roxo.
Volto com duas latinhas de Original e o isqueiro amarelo sumiu da mesa, junto com Manu.
Sirvo o copo da Luli, da Ju e o meu. Tomo um gole e desce um amargo meio morno. Demorei com o amarelinho. Vai ficar pra próxima, ou pra mais tarde.
Luli pega a carteira de cigarros e busca com olhar e mãos automáticas pelos bolsos isqueiro. Ju também saca um mentolado e começa a apalpar os bolsos e a vasculhar a bolsa.
As duas com cigarros entre os lábios e sussurram reclamando isqueiro e me olham, esperando que eu também procure. Eu meto a mão no bolso direito, tiro uma caixinha de fósforo e ofereço fogo.




Eu ri alto com esse texto!
Já falei pelo whatsapp pra você, mas vou repetir aqui: vou guardar meus isqueiros de estimação quando você vier aqui em casa. hehehe
HAHAHAHHAHA EU RI. E amei. E agora eu vou ficar atento, danadinha.